No Brasil é comum que as pessoas iniciem o uso da pílula anticoncepcional por outros motivos que não anticoncepção. Alguns exemplos são: para “regular o ciclo” (leia o texto sobre isso), para melhorar sintomas da menstruação que podem ser desconfortáveis como cólica e sangramento em grande quantidade, para diminuir sintomas de TPM, para conseguir “controlar” o dia que o sangramento vem ou mesmo para cortar a menstruação no caso do uso contínuo. Outro motivo comum de início do uso de pílula anticoncepcional é por ginecologistas e dermatologistas no tratamento auxiliar à acne.

A pílula anticoncepcional combinada possui dois hormônios na sua composição, um tipo de estrogenio (etinilestradiol ou estradiol) e um tipo de progestágeno. O que diferencia uma pílula da outra é o tipo de progestágeno que está presente. Existem dezenas de progestágenos que conferem às diferentes pílulas suas particularidades e diferenças. É por isso que algumas incham mais e outras menos, algumas tem maior risco de trombose enquanto outras são mais efetivas na redução da oleosidade da pele e cabelos. Quando o médico vai receitar uma pílula, ele deve conversar com a paciente para entender seu quadro, quais seus objetivos, histórico de saúde, doenças presentes, outras medicações que ela talvez faça uso, e, com essas informações, escolher qual a pílula mais adequada para essa mulher. Seja para o uso para controle de sintomas, como citei acima, ou para anticoncepção, esses possíveis sintomas colaterais que podem estar mais ou menos presentes nos diferentes tipos de anticoncepcionais orais sempre devem ser levados em consideração na prescrição.

Mas como a pílula age na acne?

Independente do grau da acne, a maioria das mulheres que iniciarem uso de pílula anticoncepcional combinada vão ter uma sensação de melhora na pele. Isso acontece porque os hormônios sintéticos da pílula bloqueiam a produção dos hormônios sexuais naturais do organismo e, através dessas alterações também diminui a quantidade de testosterona livre (que é a testosterona que atua na pele). O estrogenio da pílula tem já esse efeito pela via de aumento de uma proteína no sangue chamada SHBG, responsável pelo transporte de testosterona, se essa proteína esta aumentada, temos mais testosterona ligada a ela e menos testosterona livre. A diminuição da testosterona livre tem um efeito de diminuição de oleosidade na pele e cabelos na maioria das mulheres, o que, muito provavelmente, vai diminuir as lesões de acne.

Além disso, a escolha do progestágeno pode também auxiliar na acne quando é escolhido uma molécula que é antiandrogênica, sendo que a mais usada é a ciproterona. Pílulas com ciproterona (ou outros progestágenos antiandrogênicos), portanto, terão um efeito mais inibitório da oleosidade do que pílulas que possuem outros progestágenos.

Temos que lembrar, no entanto, que a acne é uma doença inflamatória sistêmica que tem relação com várias outras coisas para além dos hormônios sexuais como cuidados com a pele, saúde intestinal e alimentação. O tratamento da acne deve levar em consideração todos esses aspectos e um tratamento mais integral, que aborde todas essas facetas, terá mais sucesso.

Não vou entrar no mérito de indicação de pílulas anticoncepcionais para tratamento de acne, não sou dermatologista, mas queria abordar neste texto a situação da parada de pílula em pessoas que iniciaram o uso da medicação para tratar acne, ou que, mesmo que esse não tenha sido o motivo principal, se beneficiaram desse bloqueio da testosterona quanto à pele durante o uso da pílula e temem uma piora da acne na parada dessa medicação.

Acne de rebote na parada da pílula anticoncepcional

Quando uma mulher que estava usando pílula anticoncepcional para essa medicação, o bloqueio do eixo hormonal sexual cessa e, aos poucos, o organismo dela volta a produzir seus hormônios sexuais de forma natural. Isso faz com que ela volte a ter um ciclo menstrual. As alterações hormonais quanto ao aumento de SHBG e diminuição de testosterona livre causadas pela pílula param de acontecer, expondo o corpo, agora, a um nível maior de testosterona livre, que é o nível normal desse hormônio que seu organismo deveria ter, e tem.

O seu organismo e a sua pele, que estavam acostumados a viver em um ambiente com menos testosterona durante o uso da pílula, de repente se veem em um ambiente com um nível maior desse hormônio o que pode, temporariamente, causar um desbalanço da oleosidade podendo acarrear uma piora da pele no sentido de aumento de oleosidade, cravos e espinhas. Uma acne rebote pós-parada da pílula.

Essa condição é bem comum em mulheres que param o anticoncepcional e costuma ter um pico de 4-6 meses após a parada, com melhora após esse período. A intensidade do rebote vai depender das condições de cada pele e dos outros fatores que influenciam na acne.

Mas como me preparar para esse rebote?

A parada da pílula é algo muito benéfico em muitos aspectos para ao organismo pois ele volta a funcionar de forma a ter seus sistemas fisiológicos não bloqueados, sua produção hormonal livre. Cada vez mais mulheres estão buscando essa mudança para métodos não hormonais que não bloqueiam seus corpos, além, é claro, de mulheres que farão essa transição por desejo de engravidar.

Se você tem um histórico de acne ou tem medo dessa possível piora da pele após a parada da pílula, o ideal é que você esteja em acompanhamento com ginecologista e dermatologista para se preparar para essa mudança. 

Alguns pontos essenciais são:

  1. Já ter uma rotina de cuidados com a pele que talvez tenham que ser ajustados / intensificados nesses primeiros meses após a parada da medicação. O ideal é que esses produtos para tratamento sejam indicados por profissional habilitado.
  2. Cuidados com a alimentação. Muitas pessoas conseguem grandes mudanças no aspecto da pele e no cuidado com a acne através de ajustes alimentares, cortando ou reduzindo produtos que piorem a inflamação da pele. Cada organismo reage de um jeito às classes de alimentos, mas alguns alimentos que costumam ter esse efeito de piora e que você pode testar são: lácteos, produtos industrializados, glúten e álcool. O acompanhamento com nutricionista pode ajudar muito nesse aspecto do tratamento e prevenção. Existem também suplementações que podem ser prescritas visando uma melhora da qualidade da pele.
  3. Hidratação: beba bastante água!
  4. Conhecimento! Entender o mecanismo e o motivo dessa piora da pele após a parada da pílula e saber que isso é TRANSITÓRIO é muito importante para que esse período de adaptação seja mais tranquilo.

Seu organismo precisa de um tempo para se reequilibrar após o desbloqueio hormonal. Ele passou todo o tempo do uso da pílula vivendo em um ambiente hormonalmente diferente do habitual, com níveis hormonais muito baixos. Após a parada da pílula, o corpo pode demorar para voltar ao seu próprio equilíbrio hormonal, podendo apresentar alguns sintomas como a acne de rebote, ciclos irregulares, entre outros.

Com um cuidado integrativo e um pouco de paciência é completamente possível fazer essa transição de forma gentil e tranquila permitindo que você desbloqueie seu corpo, passe a viver da forma natural do ponto de vista hormonal e se beneficie de tudo que isso vai trazer para sua saúde e vivência menstrual.

A parada da pílula é algo muito maior do que acne e pele, ela permite que seu organismo funcione de forma natural, como ele deve funcionar. Pílula anticoncepcional não é essencial para nenhum tratamento de nenhuma doença e sempre há outras opções de tratamento que permitam que você viva um ciclo menstrual livre. Se você tem desejo de parar a pílula mas tem medo por algum motivo, procure ajuda de profissionais que respeitem essa decisão e te ajudem com os sintomas que possam aparecer nesse período de adaptação.

Dra Amanda Loretti estudou medicina na Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, e foi nessa mesma instituição que realizou suas residências médicas em Obstetrícia, Ginecologia e Medicina Fetal. Depois de formada ainda realizou especialização em Ginecologia Endócrina e hoje em dia atua principalmente em obstetrícia humanizada, ginecologia e sexualidade. Atende presencialmente em seu consultório em São Paulo, ou via telemedicina. 

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