Para a grande maioria das pessoas, o primeiro contato com sexo é através da pornografia. Não temos uma educação sexual adequada dentro de casa, nem na escola, e o máximo que somos informados sobre como funciona uma relação sexual geralmente tem a ver com proteção contra gravidez e doenças. Mas e o prazer? Sabemos algo sobre o prazer, antes de transar?

Ao “aprender” o que seria uma relação sexual normal vendo esses vídeos, por mais que a pessoa saiba que são vídeos encenados, com um diretor e produtor ditando tudo que acontece naquela cena, com um roteiro por trás, com edição, maquiagem, cortes de cena; ainda assim, esse contato vai moldando (consciente e inconscientemente) o que o espectador entende por uma relação sexual habitual/normal.

O pornô clássico vende uma imagem muito performática do casal, onde as posições são muitas vezes desconfortáveis (mas ótimas para aparecer na câmera), a cena ocorre com velocidade, barulho (gritos e gemidos altos). Toda a cena é montada de forma que os corpos estejam na melhor posição para a venda do filme. A indústria pornográfica existe visando lucro e esse lucro é obtido através da venda dos filmes, portanto não é do interesse deles fabricarem vídeos realistas, e sim PERFORMAR as fantasias mais comuns que o público alvo principal da indústria: homens heterossexuais.

O sexo real não é assim! 

Isso pode parecer óbvio para uma pessoa com experiência sexual, que já conheceu várias pessoas, ou desenvolveu muita intimidade com uma pessoa e vivenciou o que é a real sexualidade dos homens e mulheres. Mas pessoas inexperientes que nunca se envolveram sexualmente com um par, quando não têm nenhuma outra referência do que é o “normal” na cama, se forem muito expostas à pornografia podem sim ter a tendência de esperar, mesmo que inconscientemente, que a cena do encontro se desenrole mais ou menos como nos filmes.

Quanto mais exposta a pessoa é à filmes pornográficos, com violência, com fantasias, fetiches, cenas mais extremas, mais ela molda seu cérebro para esperar que isso vai acontecer na vida real, e mais ela conecta sua excitação à essas fantasias, a esses extremismos. Não é incomum meninos jovens que apresentam distúrbios sexuais no início da vida íntima como impotência ou ejaculação retardada em sexos “normais” por terem condicionado o corpo e mente à uma resposta sexual a estímulos mentais mais gráficos e violentos.

Outra questão que advém dessa exposição e da falta de educação sexual de qualidade é a expectativa de que se os homens e mulheres agirem de acordo com esses filmes, eles atingirão o nível de prazer que o filme mostra. Isso é o sexo performático. A pessoa está sempre agindo para impressionar, meio fingindo e exagerando gemidos, poses, caras e bocas que são artificiais buscando montar uma performance que se assemelhe ao que ela julga que é o sexo melhor, ideal, e que ela imagina que o parceiro/a quer, que mais excitará o outro. Nessa busca de montar uma cena perfeita, o prazer do “ator” ou “atriz” é completamente colocado em segundo plano, porque prazer sexual não tem nada a ver com uma cena montada, tem a ver com relaxamento, confiança, entrega e vulnerabilidade.

As mulheres são as maiores vítimas desse quadro por dois motivos: a indústria pornográfica é grandemente construída na objetificação do corpo da mulher e o prazer sexual feminino mostrado nos filmes é COMPLETAMENTE MENTIROSO. 

É muito comum mulheres que vivem anos realizando um sexo performático e acreditando que tem algo de errado com seus corpos que não gozam com esse sexo, como se o esperado fosse ela ter orgasmos múltiplos se agisse como a atriz pornô, fizesse seus movimentos (que muitas vezes consistem em uma penetração rápida e violenta do tipo “bate estaca” sem estimulação do clitóris). Porque no filme é isso que é retratado não? Um gozo extremo, absurdo com a performance. Mas a vida real não é performance e acho que vale relembrar o óbvio, mais uma vez, de que essas atrizes estão atuando e tudo é falso.

Essa frustração de não atingir o prazer esperado é fruto da expectativa irreal que a pornografia tradicional incute na mente dos espectadores.

Mas calma, se tudo isso é decorrente de informações erradas, educação sexual inexistente, falta de comunicação entre o casal e desconhecimento da própria anatomia e fisiologia dos corpos femininos, tem solução!

Deixem de lado a performance, o gemidinho do pornô, as roupas desconfortáveis, as posições acrobáticas e CONVERSEM sobre o que dá prazer para vocês. Mulheres que tem dificuldade de atingir o orgasmo, procurem ajuda, se masturbem, explorem o corpo de vocês, estudem sobre o assunto!

O objetivo do sexo não é ficar bonito, é ser gostoso para os dois.

Dra Amanda Loretti estudou medicina na Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, e foi nessa mesma instituição que realizou suas residências médicas em Obstetrícia, Ginecologia e Medicina Fetal. Depois de formada ainda realizou especialização em Ginecologia Endócrina e hoje em dia atua principalmente em obstetrícia humanizada, ginecologia e sexualidade. Atende presencialmente em seu consultório em São Paulo, ou via telemedicina. 

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