A primeira vez é um momento de muitas novidades na vida de pessoas que estão iniciando a vida sexual. Muitas vezes homens e mulheres, ou meninos e meninas, que estão começando a se relacionar sexualmente, não tem com quem conversar por vergonha, falta de disponibilidade dos pais, amigos, professores, medos, tabus, enfim, sexualidade ainda é um tema não discutido com naturalidade na sociedade. Mas a informação pode ser a diferença entre uma experiência boa, divertida e gostosa, e uma experiência ruim, traumática e até abusiva!

Como ginecologista, eu sou, em alguns casos, a pessoa que vai explicar e conversar sobre sexo com meninas e mulheres e, juntando as principais dúvidas e questionamentos delas, junto com algumas coisas que eu acho essenciais de saber antes de transar com alguém, trago aqui os principais pontos que você precisa saber antes da primeira vez!

Virgindade não diz respeito apenas à penetração

Sexo é toda atividade corporal que eleva a intimidade desse casal, cada pessoa pode ter suas interpretações sobre isso, mas eu acredito que tudo que for feito entre duas pessoas que mude o padrão da intimidade, tenha consequências, tanto físicas como emocionais, culturais e sociais para esse casal, é considerado sexo. Portanto, vamos começar essa conversa partindo da premissa que amassos mais pesados, masturbação, sexo oral, vaginal e anal são igualmente sexo.

Apesar de a virgindade ser historicamente relacionada ao rompimento do hímen em mulheres, essa definição é simplista e exclui uma vasta gama de atividades sexuais igualmente importantes e com as mesmas consequências que a penetração vaginal.

O tal do hímen: Sempre rompe? Sangra? Dói?

Considerando que para muitas meninas e mulheres a principal preocupação quando falamos da primeira vez é com a penetração vaginal e com o que acontece com o hímen, vamos falar agora sobre essa modalidade de sexo. 

O hímen é uma pelinha que se encontra logo na entrada da vagina, em toda a sua extensão, feito de mucosa, com um orifício no meio, por onde sai o sangue menstrual. Esse orifício deve estar presente, porque, se ele não existir, o sangue menstrual não sai e fica preso dentro da vagina e do útero. Essa condição existe e chama “hímen imperfurado” e é uma condição médica que precisa de uma pequena cirurgia para abrir um buraquinho para sair o sangue da menstruação. Mas não se preocupe! Se você já menstruou alguma vez, você não tem isso!

Esse orifício do hímen não é igual de mulher para mulher, ele varia no seu tamanho, quantidade e formato e o hímen em si, a pele, também pode ser mais grossa, mais fina, mais elástica ou mais firme.

Tipos de hímen. Fontes: Williams Gynecology Second Edition

As pessoas conhecem a imagem do hímen anular e acham que todos são desse tipo, mas essa diferença entre os tipos de hímen é uma das responsáveis por diferentes experiências na primeira penetração vaginal. Quanto mais aberto esse hímen for, mas fino e elástico seu tecido, menos dificuldade de penetração essas pessoas vão ter (em relação ao hímen). Por outro lado, um hímen com um orifício menor e um tecido mais grosso, mas rígido, ou himens do tipo cribriformes ou microperfurados, podem apresentar uma maior dificuldade e maior sangramento no momento da penetração vaginal. Dependendo dessas características individuais, a mulher pode sangrar pouco ou muito, não sangrar na primeira vez e sim nas próximas, ou nunca sangrar. No caso de hímens mais elásticos, ele pode não romper, não fissurar, e, apenas, se alargar e voltar ao que era antes, após a penetração.

Tem como as pessoas saberem que eu já transei?

Não! Além de ser extremamente antiético e contraindicado pelos Conselhos de Medicina, atestados de virgindade são impossíveis de serem realizados já que o aspecto da vulva e da vagina não se modifica quando a pessoa já teve penetração vaginal. Ao avaliar uma mulher, em um exame físico ginecológico, pode ser ou não possível dizer se ela transou ou não, como isso não é certeiro, nunca deve ser realizado, principalmente se não houver o consentimento da mulher (sem consentimento o exame ginecológico é considerado abuso sexual).

Vale dizer também que a vagina não fica mais larga quando você tem relações sexuais, independente do numero de parceiros, independente do tamanho do pênis. A vagina é um órgão elástico que se estica e volta ao formato e tamanho inicial após o sexo.

A primeira vez dói?

Essa é uma dúvida muito comum e talvez a que mais assusta e permeia a imaginação das mulheres que nunca transaram com penetração. A primeira penetração pode ou não doer. A dor que pode ocorrer pode vir de dois lugares: ou do hímen, no caso da rotura de um hímen mais grossinho, ou das paredes vaginais.

A dor da rotura do hímen é mais rara e é mais um ardor na região bem da entrada na vagina como se houvesse um cortizinho, é uma dor, geralmente, mais aguda e mais fraca.

A dor que mais pode incomodar durante as primeiras penetrações é a dor da vagina em si, das paredes vaginais. Essa dor, quando presente, é uma dor mais generalizada, não é possível identificar exatamente onde ela é, pode ser em peso, em cólica, e está relacionada com a contração dos músculos da vagina no momento da penetração. Essa possível dor na vagina, muscular, é MUITO relacionada com o grau de relaxamento e tensão da mulher no momento do sexo.

Normalmente, na primeira penetração, devido a diversos motivos: medo, desconhecimento, informações erradas, falta de confiança no parceiro, ansiedade, culpa, a mulher está muito tensa. Quando estamos com medo, tendemos a ficar com os músculos contraídos e isso não exclui os músculos da vagina. Em toda situação em que for ocorrer uma penetração vaginal, no sexo, em exames ginecológicos, na masturbação, uma condição essencial para que esse ato ocorra de forma mais confortável e com menos chance de machucar a mulher, é o relaxamento. Para não sentir essa dor, ou minimizá-la, é muito importante que você esteja em um lugar confortável, fazendo isso porque você quer, e não porque o parceiro quer, com uma pessoa de confiança, com consentimento, gentileza, calma, devagar e sob seu controle. Quanto mais relaxada e tranquila você estiver, menor o possível incômodo da primeira vez.

E sim, é possível não sentir NADA de dor, nem de hímen e nem de vagina na primeira vez (e em todas as outras).

Preciso de lubrificante?

Lubrificantes são géis ou óleos específicos para o uso no sexo. O uso desses produtos diminui o atrito entre os corpos e tudo escorrega com mais facilidade. Ao contrário do que muitas pessoas pensam, o uso de lubrificante é indicado para todas as pessoas que transam, não apenas para mulheres que não tem lubrificação. Particularmente no início da vida sexual, o uso de lubrificantes pode diminuir a possibilidade de dor, de sangramento, de fissuras ou lesões na vulva e vagina, além de melhorar a sensação podendo melhorar o prazer sexual. Mesmo meninas e mulheres com lubrificação normal se beneficiam do uso de lubrificantes, principalmente em relações sexuais mais longas e com uso de preservativo.

Os lubrificantes também sempre devem ser usados na masturbação para facilitar os movimentos e diminuir a chance de machucar o pênis e a vulva.

Atenção para o fato de que existem lubrificantes que não são ideais para o uso com preservativos, então sempre prefira os géis a base de água nessas situações.

Infecções sexualmente transmissíveis (ISTs)

Que sexo pode transmitir doenças vocês com certeza já sabem, então vou focar em questões mais específicas que possam ser novidades: sexo oral transmite ISTs assim como sexo com penetração, varias ISTs não são preveníveis com preservativo e você deve observar o genital do seu parceiro ou parceira antes de transar com essa pessoa!

A transmissão de ISTs no sexo oral pode ser minimizada com o uso de preservativo no pênis durante o sexo oral no homem e o uso de filmes plásticos na vulva no sexo oral em mulheres. Quando falamos de transmissão de HIV e hepatites, o contato da mucosa da boca com sêmen ou mesmo da mucosa da vulva (mesmo sem penetração) também é capaz de transmitir esses vírus, então não adianta ser super preocupada com a camisinha na penetração e não ligar para isso no sexo oral!

Mesmo com o uso de proteção, é possível transmitir doenças como HPV, sífilis, herpes, entre outras, apenas pelo contato pele-pele, portanto, sempre dê uma olhada no genital antes de transar, e, se houver uma ferida, úlcera, verruga, não se relacione e oriente a pessoa a procurar um médico. O mesmo vale pra você! Se tiver qualquer sintoma, procure um médico e avise seus parceiros!

Gravidez

Sexo com penetração vaginal pode levar a gravidez, então, se você não quer engravidar, deve pensar em algum anticoncepcional, seja medicamentoso, seja o preservativo, mas sempre tenha em mente que se ocorrer alguma falha, como a camisinha romper ou sair no meio, você tem que saber como usar a contracepção de emergência (pílula do dia seguinte).

Vale lembrar também que sêmen na entrada na vagina (mesmo por fora), transar sem camisinha e só colocar no momento da ejaculação e tocar a vagina com a mão com sêmen também pode levar a gravidez.

Conheça seu corpo antes de dividi-lo com outra pessoa

O conhecimento da própria anatomia é o principal ponto, eu diria, responsável pelo prazer sexual durante toda a vida, e isso não é diferente nos primeiros encontros sexuais.

Se o seu objetivo no sexo é ter prazer, é essencial que você conheça seu corpo, entenda onde você gosta de ser tocada e como. O órgão do prazer sexual feminino é o clitóris, portanto a maioria das mulheres sente um maior prazer sexual e só atingem o orgasmo pela manipulação externa do clitóris (na vulva). É muito importante que você tenha se tocado, se estudado. Coloque um espelho e observe seus órgãos genitais, saiba o que é o que, saiba como o toque dessas áreas faz você se sentir. Em uma relação sexual, para a grande maioria das mulheres, para se obter mais prazer, é necessário o estímulo do clitóris durante a penetração, sendo que apenas um terço das mulheres consegue atingir o orgasmo apenas com a penetração vaginal. Na dúvida, nas primeiras vezes, busque estimular o clitóris durante a penetração (você ou seu parceiro). Dessa forma, fazendo do jeito que você já sabe como você gosta, a chance de ter uma experiência mais prazerosa é muito maior.

Anatomia da vulva

Consentimento

Tudo que fazemos na nossa vida sexual, de intimidade, fica marcado no nosso corpo e no nosso inconsciente. Experiências negativas que podem parecer bobas na hora, podem desenvolver traumas e transtornos que eu recebo no consultório anos depois e que são de difícil tratamento. O melhor cenário seria realmente se poupar de violências e agressões, se possível. É claro que as vezes coisas ruins acontecem sem nosso consentimento, coisas que fogem do controle e que não tinha nada que nós pudéssemos fazer para evita-las. Mas, as vezes, elas acontecem porque nós, mulheres, fomos criadas em uma sociedade que nos coloca em um papel de “pessoas que devem agradar” e, quando estamos em uma situação íntima, mesmo percebendo que algo está acontecendo que não queremos, temos medo ou vergonha de dizer não. É muito importante que todas as pessoas que transam entendam que o consentimento é algo imprescindível e que pode ser retirado a qualquer momento. Não é porque você disse que iria transar que tem que transar, não é porque você ficou pelada que tem que transar, não é porque você começou a transar que não pode parar tudo no meio! Você pode e tem todo o direito de se negar ou parar qualquer tipo de interação sexual quando você quiser (e seu parceiro também).

Segue abaixo um vídeo bem bonitinho que eu acho que explica de forma muito clara o que é consentimento e que ele pode ser revogado a qualquer momento e essa decisão deve ser respeitada. Tudo que acontece depois do “não” é ESTUPRO.

Resumindo,

eu diria que o principal quando falamos da primeira vez é: siga sua intuição, não faça nada que não quer, não faça nada porque está sofrendo algum tipo de pressão do parceiro ou do grupo, prazer e orgasmo é algo que aprendemos através da exploração do nosso corpo e exige treino, seja responsável com seu corpo e com o corpo do outro, tem coisas que não tem volta.

Se tiverem dúvidas ou quiserem compartilhar pensamentos e relatos podem entrar em contato comigo. Falar sobre seus medos e suas experiências é um caminho saudável para uma sexualidade positiva.

Dra Amanda Loretti estudou medicina na Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, e foi nessa mesma instituição que realizou suas residências médicas em Obstetrícia, Ginecologia e Medicina Fetal. Depois de formada ainda realizou especialização em Ginecologia Endócrina e hoje em dia atua principalmente em obstetrícia humanizada, ginecologia e sexualidade. Atende em seu consultório, que fica localizado na Vila Mariana, em São Paulo. 

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